segunda-feira, 22 de março de 2021

Mudança

Morar na mudança é não ter chão e ao mesmo tempo ter todos os chãos do mundo. É leveza porque é desapego, de ideias, de coisas, de sentimentos, de verdades. É peso porque é abandono, saudade, medo. É ter a incerteza como convidada frequente para os seus dias.


Sempre fugi das mudanças, pelo menos as profundas, enquanto isso me sentia traída pelas mudanças mundanas.
Uma loja fechava e eu já tinha a certeza que nunca mais encontraria o que só era vendido ali. Uma pessoa se aposentava e a constatação de que não a encontraria mais naquele café, fazia com que o lugar perdesse o encanto. Uma simples receita era alterada e já não sentia mais o mesmo sabor ao degustar a saudosa iguaria.

Com o tempo fui me dando conta que tamanho apego me aprisionava, pois, havia uma parte de mim que namorava a mudança, a parte de fora de mim tocava o novo, buscava incessantemente o novo, enquanto a parte de dentro de mim se ressentia da infidelidade da minha superfície.

Não sei bem como a mudança chegou, não foi revoada barulhenta de maritacas ao amanhecer, foi canto triste de sabiá chamando a amada à noitinha.

O novo foi entrando pelas frestas de mim, me convidando para um olhar torto, um passo errante, um movimento inesperado.
Aos poucos eu me deixei re-novar e a mudança que vivia fora veio morar dentro e eu que vivia dentro fui morar na mudança de fora.

Texto elaborado por mim em 02/03/2021 para a Missão n°1 do projeto #aCasadasPalavras + #PalavraAsa por @waau.ideias e @palavra.asa.

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